Especiais


A DITADURA MILITAR NO BRASIL (1964 - 1985)
Introdução 
Podemos definir a Ditadura Militar como sendo o período da política brasileira em que os militares governaram o Brasil. Esta época vai de 1964 a 1985. Caracterizou-se pela falta de democracia, supressão de direitos constitucionais, censura, perseguição política e repressão aos que eram contra o regime militar.
O golpe militar de 1964
A crise política se arrastava desde a renúncia de Jânio Quadros em 1961. O vice de Jânio era João Goulart, que assumiu a presidência num clima político adverso. O governo de João Goulart (1961-1964) foi marcado pela abertura às organizações sociais. Estudantes, organização populares e trabalhadores ganharam espaço, causando a preocupação das classes conservadoras como, por exemplo, os empresários, banqueiros, Igreja Católica, militares e classe média. Todos temiam uma guinada do Brasil para o lado socialista. Vale lembrar, que neste período, o mundo vivia o auge da Guerra Fria.
Este estilo populista e de esquerda, chegou a gerar até mesmo preocupação nos EUA, que junto com as classes conservadoras brasileiras, temiam um golpe comunista.

Os partidos de oposição, como a União Democrática Nacional (UDN) e o Partido Social Democrático (PSD), acusavam Jango de estar planejando um golpe de esquerda e de ser o responsável pela carestia e pelo desabastecimento que o Brasil enfrentava.
No dia 13 de março de 1964, João Goulart realiza um grande comício na Central do Brasil ( Rio de Janeiro ), onde defende as Reformas de Base. Neste plano, Jango prometia mudanças radicais na estrutura agrária, econômica e educacional do país.

Seis dias depois, em 19 de março, os conservadores organizam uma manifestação contra as intenções de João Goulart. Foi a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que reuniu milhares de pessoas pelas ruas do centro da cidade de São Paulo.

O clima de crise política e as tensões sociais aumentavam a cada dia. No dia 31 de março de 1964, tropas de Minas Gerais e São Paulo saem às ruas. Para evitar uma guerra civil, Jango deixa o país refugiando-se no Uruguai. Os militares tomam o poder. Em 9 de abril, é decretado o Ato Institucional Número 1 (AI-1). Este, cassa mandatos políticos de opositores ao regime militar e tira a estabilidade de funcionários públicos.
GOVERNO CASTELLO BRANCO (1964-1967) 
Castello Branco, general militar, foi eleito pelo Congresso Nacional presidente da República em 15 de abril de 1964. Em seu pronunciamento, declarou defender a democracia, porém ao começar seu governo, assume uma posição autoritária. 
Estabeleceu eleições indiretas para presidente, além de dissolver os partidos políticos. Vários parlamentares federais e estaduais tiveram seus mandatos cassados, cidadãos tiveram seus direitos políticos e constitucionais cancelados e os sindicatos receberam intervenção do governo militar.
Em seu governo, foi instituído o bipartidarismo. Só estavam autorizados o funcionamento de dois partidos: Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e a Aliança Renovadora Nacional (ARENA). Enquanto o primeiro era de oposição, de certa forma controlada, o segundo representava os militares.
O governo militar impõe, em janeiro de 1967, uma nova Constituição para o país. Aprovada neste mesmo ano, a Constituição de 1967 confirma e institucionaliza o regime militar e suas formas de atuação.
GOVERNO COSTA E SILVA (1967-1969)
Em 1967, assume a presidência o general Arthur da Costa e Silva, após ser eleito indiretamente pelo Congresso Nacional. Seu governo é marcado por protestos e manifestações sociais. A oposição ao regime militar cresce no país. A UNE (União Nacional dos Estudantes) organiza, no Rio de Janeiro, a Passeata dos Cem Mil. 
Em Contagem (MG) e Osasco (SP), greves de operários paralisam fábricas em protesto ao regime militar.
A guerrilha urbana começa a se organizar. Formada por jovens idealistas de esquerda, assaltam bancos e seqüestram embaixadores para obterem fundos para o movimento de oposição armada.
No dia 13 de dezembro de 1968, o governo decreta o Ato Institucional Número 5 ( AI-5 ). Este foi o mais duro do governo militar, pois aposentou juízes, cassou mandatos, acabou com as garantias do habeas-corpus e aumentou a repressão militar e policial.



GOVERNO DA JUNTA MILITAR (31/8/1969-30/10/1969)
Doente, Costa e Silva foi substituído por uma junta militar formada pelos ministros Aurélio de Lira Tavares (Exército), Augusto Rademaker (Marinha) e Márcio de Sousa e Melo (Aeronáutica). 
Dois grupos de esquerda, O MR-8 e a ALN seqüestram o embaixador dos EUA Charles Elbrick. Os guerrilheiros exigem a libertação de 15 presos políticos, exigência conseguida com sucesso. Porém, em 18 de setembro, o governo decreta a Lei de Segurança Nacional. Esta lei decretava o exílio e a pena de morte em casos de "guerra psicológica adversa, ou revolucionária, ou subversiva".
No final de 1969, o líder da ALN, Carlos Mariguella, foi morto pelas forças de repressão em São Paulo.
GOVERNO MEDICI (1969-1974)
Em 1969, a Junta Militar escolhe o novo presidente: o general Emílio Garrastazu Medici. Seu governo é considerado o mais duro e repressivo do período, conhecido como " anos de chumbo ". A repressão à luta armada cresce e uma severa política de censura é colocada em execução. Jornais, revistas, livros, peças de teatro, filmes, músicas e outras formas de expressão artística são censuradas. Muitos professores, políticos, músicos, artistas e escritores são investigados, presos, torturados ou exilados do país. O DOI-Codi (Destacamento de Operações e Informações e ao Centro de Operações de Defesa Interna ) atua como centro de investigação e repressão do governo militar.
Ganha força no campo a guerrilha rural, principalmente no Araguaia. A guerrilha do Araguaia é fortemente reprimida pelas forças militares.

O Milagre Econômico
Na área econômica o país crescia rapidamente. Este período que vai de 1969 a 1973 ficou conhecido com a época do Milagre Econômico. O PIB brasileiro crescia a uma taxa de quase 12% ao ano, enquanto a inflação beirava os 18%. Com investimentos internos e empréstimos do exterior, o país avançou e estruturou uma base de infra-estrutura. Todos estes investimentos geraram milhões de empregos pelo país. Algumas obras, consideradas faraônicas, foram executadas, como a Rodovia Transamazônica e a Ponte Rio-Niteroi.
Porém, todo esse crescimento teve um custo altíssimo e a conta deveria ser paga no futuro. Os empréstimos estrangeiros geraram uma dívida externa elevada para os padrões econômicos do Brasil.



GOVERNO GEISEL (1974-1979)
Em 1974 assume a presidência o general Ernesto Geisel que começa um lento processo de transição rumo à democracia. Seu governo coincide com o fim do milagre econômico e com a insatisfação popular em altas taxas. A crise do petróleo e a recessão mundial interferem na economia brasileira, no momento em que os créditos e empréstimos internacionais diminuem.

Geisel anuncia a abertura política lenta, gradual e segura. A oposição política começa a ganhar espaço. Nas eleições de 1974, o MDB conquista 59% dos votos para o Senado, 48% da Câmara dos Deputados e ganha a prefeitura da maioria das grandes cidades.
Os militares de linha dura, não contentes com os caminhos do governo Geisel, começam a promover ataques clandestinos aos membros da esquerda. Em 1975, o jornalista Vladimir Herzog á assassinado nas dependências do DOI-Codi em São Paulo. Em janeiro de 1976, o operário Manuel Fiel Filho aparece morto em situação semelhante.
Em 1978, Geisel acaba com o AI-5, restaura o habeas-corpus e abre caminho para a volta da democracia no Brasil.
GOVERNO FIGUEIREDO (1979-1985) 
A vitória do MDB nas eleições em 1978 começa a acelerar o processo de redemocratização. O general João Baptista Figueiredo decreta a Lei da Anistia, concedendo o direito de retorno ao Brasil para os políticos, artistas e demais brasileiros exilados e condenados por crimes políticos. Os militares de linha dura continuam com a repressão clandestina. Cartas-bomba são colocadas em órgãos da imprensa e da OAB (Ordem dos advogados do Brasil). No dia 30 de Abril de 1981, uma bomba explode durante um show no centro de convenções do Rio Centro. O atentado fora provavelmente promovido por militares de linha dura, embora até hoje nada tenha sido provado.
Em 1979, o governo aprova lei que restabelece o pluripartidarismo no país. Os partidos voltam a funcionar dentro da normalidade. A ARENA muda o nome e passa a ser PDS, enquanto o MDB passa a ser PMDB. Outros partidos são criados, como: Partido dos Trabalhadores ( PT ) e o Partido Democrático Trabalhista ( PDT ).
A Redemocratização e a Campanha pelas Diretas Já
Nos últimos anos do governo militar, o Brasil apresenta vários problemas. A inflação é alta e a recessão também. Enquanto isso a oposição ganha terreno com o surgimento de novos partidos e com o fortalecimento dos sindicatos.
Em 1984, políticos de oposição, artistas, jogadores de
futebol e milhões de brasileiros participam do movimento das Diretas Já. O movimento era favorável à aprovação da Emenda Dante de Oliveira que garantiria eleições diretas para presidente naquele ano. Para a decepção do povo, a emenda não foi aprovada pela Câmara dos Deputados.
No dia 15 de janeiro de 1985, o Colégio Eleitoral escolheria o deputado Tancredo Neves, que concorreu com Paulo Maluf, como novo presidente da República. Ele fazia parte da Aliança Democrática – o grupo de oposição formado pelo PMDB e pela Frente Liberal.
Era o fim do regime militar. Porém Tancredo Neves fica doente antes de assumir e acaba falecendo. Assume o vice-presidente José Sarney. Em 1988 é aprovada uma nova constituição para o Brasil. A Constituição de 1988 apagou os rastros da ditadura militar e estabeleceu princípios democráticos no país.
FONTE: www.suapesquisa.com



 JUSCELINO KUBITSCHEK


Juscelino Kubitschek de Oliveira nasceu em Diamantina (MG) no dia 12 de setembro de 1902, filho de João César de Oliveira e de Júlia Kubitschek. Ingressou no seminário diocesano em 1914. Aos 15 anos incompletos concluiu o curso de humanidades, abandonando então o seminário, já que não sentia vocação para o sacerdócio.
Em 1919 foi trabalhar na Repartição Geral dos Telégrafos. Exerceu a função de telegrafista até se formar pela Faculdade de Medicina de Belo Horizonte.
Diplomando-se em dezembro de 1927, foi trabalhar na Clínica Cirúrgica da Santa Casa de Misericórdia, na capital mineira. Posteriormente seguiu para Paris com o objetivo de especializar-se em urologia. Ao regressar, além de reassumir seus empregos em Belo Horizonte, montou seu próprio consultório. Em 1931 foi nomeado para integrar o corpo de médicos do Hospital Militar da Força Pública do estado de Minas Gerais. Em dezembro casou-se com Sara Gomes de Lemos, pertencente a família de grande prestígio no estado.
Com o falecimento súbito de Olegário Maciel em 5 de setembro de 1933, agitou-se o cenário político mineiro para a escolha de seu sucessor. Em 12 de dezembro Vargas deu uma solução inesperada ao caso, nomeando Benedito Valadares interventor federal. Este, ao tomar posse no dia seguinte, convidou Juscelino para exercer a chefia de seu Gabinete Civil.
No exercício da chefia do Gabinete Civil de Valadares, Juscelino tornou-se uma espécie de "advogado" das causas de seu município natal. Em abril de 1934, por influência de Valadares, filiou-se ao Partido Progressista de Minas Gerais (PP) com o objetivo de concorrer ao cargo de deputado federal nas eleições de outubro seguinte. Em setembro foi indicado por Antônio Carlos para ocupar a secretaria do partido. 
Realizadas as eleições em outubro, Juscelino foi eleito para seu praimeiro mandato parlamentar, iniciado em maio de 1935. Ante a necessidade de permanecer no Rio de Janeiro, então capital da República, licenciou-se do cargo que ocupava no Hospital Militar, bem como das funções que exercia na Santa Casa de Misericórdia em Belo Horizonte.
Diante da agitação reinante no cenário político, Vargas, com o apoio das forças armadas, antecipou o golpe para o dia 10 de novembro de 1937. Fechando nesse dia o Congresso Nacional, instituiu o Estado Novo e assumiu poderes ditatoriais. Juscelino perdeu seu mandato na Câmara e retornou à medicina, reassumindo as funções de chefe do Serviço de Urologia do Hospital Militar em Belo Horizonte. Em fins de 1938 foi promovido a tenente-coronel da Força Pública e, simultaneamente, nomeado chefe do Serviço de Cirurgia do Hospital Militar.
Em fevereiro de 1940 foi convidado por Benedito Valadares para assumir o cargo de prefeito de Belo Horizonte. Durante a entrevista, negou-se a aceitar a nomeação por não desejar, mais uma vez, afastar-se da medicina. Entretanto, dois meses depois do convite inicial, tomou conhecimento de que Valadares mandara publicar no Minas Gerais, órgão oficial do estado, o decreto de sua nomeação para a prefeitura da capital. Considerando o fato consumado, Juscelino tomou posse no cargo no dia seguinte.
Embora ocupando o cargo de prefeito, permaneceu na chefia do Serviço de Cirurgia do Hospital Militar, onde continuou a operar todas as manhãs, e assumiu ainda a chefia do Serviço de Urologia da Santa Casa de Misericórdia. Além dessas atividades proporcionava, pessoalmente, assistência médica a numerosas famílias pobres. Só abandonaria o exercício da medicina no início de 1945, quando passou a dedicar-se exclusivamente à vida política.
Preocupado em remodelar a cidade de Belo Horizonte, Juscelino abriu grandes avenidas e dedicou-se às obras de infra-estrutura da cidade, removendo e ampliando as redes de esgoto e abastecimento de água, além de construiu o conjunto arquitetônico de Pampulha, um dos maros da moderna arquitetura brasileira, projetado por Oscar Niemeyer.
Em março de 1945, quando os agrupamentos que dariam origem aos novos partidos políticos já se organizavam, participou ativamente dos trabalhos de criação do Partido Social Democrático (PSD), que seria formado principalmente em torno dos interventores, com o apoio de Vargas. No dia 8 de outubro reuniu-se em Belo Horizonte a comissão executiva do PSD mineiro com o objetivo de indicar os candidatos do partido à Assembléia Nacional Constituinte. Dentre os concorrentes às cadeiras de deputado federal, teve seu nome lançado.
Com a deposição de Vargas pelas forças armadas em 29 de outubro, assumiu o poder o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro José Linhares. Uma de suas primeiras medidas foi substituir os interventores por representantes do Poder Judiciário e afastar os antigos prefeitos. Juscelino foi então substituído pelo engenheiro João Gusmán Júnior.
O resultado do pleito de 2 de dezembro de 1945 conferiu ampla vitória ao PSD tanto no nível estadual como nacional. Dutra conquistou a presidência da República e Kubitschek foi o segundo candidato mais votado em seu estado, iniciando o mandato ao se instalar a Constituinte em fevereiro de 1946. Promulgada a nova Carta em setembro de 1946, a Assembléia Constituinte foi transformada em Congresso ordinário, permanecendo Juscelino no exercício de seu mandato na Câmara Federal.
A partir de março de 1947 desencadeou franca oposição ao governo de seu estado. De maio a julho de 1948 viajou aos Estados Unidos e Canadá. Segundo suas memórias, essa viagem teria exercido grande influência em suas concepções político-administrativas, por convencê-lo de que o Brasil só atingiria um pleno desenvolvimento com um processo de industrialização intenso e diversificado.
Em 20 de julho de 1950, uma comissão executiva do PSD escolheu Kubitschek para disputar as eleições. Sua candidatura foi finalmente homologada em 30 de julho, durante a convenção do PSD mineiro. Getúlio Vargas elegeu-se presidente da República e Juscelino Kubitschek conquistou o governo mineiro. Em 31 de janeiro de 1951 ambos tomaram posse nos cargos para os quais haviam sido eleitos.
A base de sua administração seria o binômio energia e transporte. Tinha como meta prioritária retirar o estado de Minas da posição de estado agropastoril e lançá-lo na fase da industrialização.
Em fins de 1954 as eleições foram realizadas na data prevista. Por aquela época já se tornara público que Juscelino pretendia concorrer no ano seguinte ao pleito presidencial. Em princípios de novembro o PSD decidiu definitivamente indicar um candidato próprio. O nome de Juscelino se impunha, quase sem divergências, à consideração da liderança do partido. Entretanto, além da oposição dos udenistas e de certos setores militares, teria de enfrentar o problema da sucessão estadual, pois se fosse candidato seria obrigado a deixar o governo mineiro dez meses antes de expirar o mandato.
Teve sua candidatura homologada pela convenção nacional do PSD que se reuniu em 10 de fevereiro de 1955. Após o lançamento oficial de sua candidatura, a movimentação contra as eleições e a favor da intervenção dos militares tornou-se mais evidente. Juscelino era tido como comprometido com as forças getulistas destronadas em agosto de 1954.
Em 31 de março desincompatibilizou-se do governo de Minas Gerais. No dia 4 de abril, em comício realizado em Jataí (GO), assumiu o compromisso de transferir a capital do país para o planalto Central, caso fosse eleito. O programa de seu governo, organizado com o auxilio de uma equipe de técnicos, constituía o famoso Programa de Metas.
No dia 13 de abril o diretório nacional do PSD aceitou a indicação do PTB para que seu líder, João Goulart, figurasse na chapa de Juscelino como candidato à vice-presidente. A candidatura de ambos foi homologada pelo PTB cinco dias depois, durante a convenção nacional do partido.
Garantidas pelas tropas do Exército, em 3 de outubro realizaram-se as eleições, cuja apuração foi concluída em meados do mês. Logo após a divulgação dos resultados, a União Democrática Nacional (UDN) e seus aliados deram início a uma batalha judiciária com o objetivo de anular as eleições e impedir a proclamação dos candidatos eleitos.
Liderados por Carlos Lacerda, setores udenistas passaram a pregar abertamente a deflagração de um golpe militar. Na manhã do dia 3 de novembro, o presidente Café Filho adoeceu repentinamente, transmitindo cinco dias depois o governo ao seu sucessor legal, o presidente da Câmara, Carlos Luz. Entretanto, no dia 11 de novembro, o Congresso Nacional, em sessão especial, aprovou o impedimento de Carlos Luz , dando posse na presidência da República a Nereu Ramos.
Na madrugada de 22 de novembro o Congresso aprovou o impedimento de Café Filho, confirmando Nereu Ramos como presidente legal até a posse de Juscelino, em janeiro do ano seguinte.
Ao assumir a presidência da República em 31 de janeiro de 1956, Juscelino solicitou ao Congresso a abolição do estado de sítio, no que seria logo atendido. Para imprimir um cunho ainda mais democrático à sua gestão, também aboliu, no dia seguinte, a censura à imprensa.
Logo no início de seu governo defrontou-se com séria oposição deflagrada por oficiais da Aeronáutica que, inconformados com sua posse, pregavam a sua deposição. Entretanto, no dia 29 de fevereiro o levante já havia sido totalmente debelado. Uma vez encerrado o episódio, Juscelino enviou ao Congresso um projeto de lei concedendo anistia ampla e irrestrita a todos os civis e militares que tivessem participado de movimentos políticos ou militares no período de 10 de novembro de 1955 a 19 de março de 1956.
Em 18 de abril assinou, no aeroporto de Anápolis (GO), a mensagem a ser enviada ao Congresso, juntamente com o projeto de lei propondo a transferência da capital da República para o planalto Central. A despeito da séria resistência por parte da UDN em relação à transferência da capital do país, o projeto foi aprovado pelo Congresso Nacional. Em 19 de setembro Juscelino sancionou a lei que fixava os limites do futuro Distrito Federal e autorizava o governo a instituir a Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap).
Em fins de 1956, atendendo a reivindicação da Marinha e da Aeronáutica, autorizou a compra do porta-aviões Minas Gerais, fabricado na Inglaterra. O fato suscitou grave crise entre as duas armas, pois a Marinha, apesar dos fortes protestos da Aeronáutica, reivindicava controle da aviação embarcada no porta-aviões. A questão iria estender-se por governos posteriores, só sendo resolvida em agosto de 1964 pelo presidente Humberto Castelo Branco, que garantiu à Aeronáutica a posse das aeronaves embarcadas.
Também no final de 1956, o recrudescimento no cenário mundial da chamada guerra fria, e o interesse norte-americano em ampliar suas instalações defensivas contra a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), fizeram com que o embaixador dos Estados Unidos da América (EUA) no Brasil, Ellis Briggs, em nome de seu país, solicitasse permissão ao governo brasileiro, no sentido de ser instalada em Pernambuco uma estação de rastreamento de foguetes. Kubitschek submeteu o assunto aos ministros militares, os quais vetaram o local escolhido, sugerindo o território de Fernando de Noronha. Em 17 de dezembro foi assinado o acordo que tinha por base os termos e resoluções do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, de 1947, e do Acordo de Assistência Militar, de 1952.
Em março de 1957, em concurso organizado por Oscar Niemeyer, foi aprovado o plano-piloto de autoria do arquiteto e urbanista Lúcio Costa para a construção de Brasília.
Ainda em 1957 , depois de pleitear empréstimos junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), conhecido como Banco Mundial, foi proposto o reatamento das relações comerciais com a URSS tendo em vista, sobretudo, o interesse na venda do café. Todavia, o ministro da Guerra, general Lott, opôs-se resolutamente à medida, alegando motivo de segurança nacional.
Em março de 1958 uma terrível seca assolou o Nordeste. Devido ao estado de emergência configurado, Kubitschek seguiu, em 17 de abril, para o interior do Ceará, não só para avaliar a gravidade da situação, como para visitar as obras do açude de Araras, regressando três dias depois.
Em fins de 1958, contrária à transferência da capital da República, a UDN tomou iniciativas para adiar o evento. Carlos Lacerda requereu uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que intimava os diretores da Novacap e todos os empreiteiros das obras a prestarem depoimento alegando irregularidades na construção de Brasília. Entretanto, as forças que apoiavam o governo comprometeram-se a adiar a CPI até a inauguração da nova capital.
No dia 17 de junho tornou-se público o rompimento de Juscelino com o FMI, provocado pela recusa do governo brasileiro em ceder às exigências do órgão para a concessão de financiamentos. A população do Rio, representada por suas organizações de classe, compareceu em massa ao Palácio do Catete em atitude de solidariedade ao presidente, portando faixas e cartazes em favor do estabelecimento de relações diplomáticas do Brasil com a União Soviética e a China Popular.
Em julho, ainda em meio à celeuma decorrente da ruptura do governo com o FMI, Walter Moreira Sales foi nomeado embaixador do Brasil em Washington. Ernâni Amaral Peixoto, que exercia essas funções, assumiu o Ministério da Viação e Obras Públicas em substituição a Lúcio Meira, que substitui Roberto Campos, exonerado também neste mês da presidência do BNDE.
Diante da tensão reinante no cenário político, no início de 1959 o governo chegou a ameaçar a decretação do estado de sítio. Em março deste ano o Nordeste foi submetido novamente a uma situação dramática, pelo desabamento de fortes temporais que ameaçavam a população com enchentes e inundações.
Em 21 de abril de 1960 Kubitschek declarou inaugurada a nova capital, Brasília. Durante a primeira reunião ministerial realizada no Palácio do Planalto, assinou mensagem dirigida ao Congresso, propondo a criação da Universidade de Brasília (UnB).
Durante a primeira reunião de seu ministério, realizada no dia 1º de fevereiro de 1956, Juscelino expôs seu plano de governo - o Programa de Metas - e instituiu o Conselho de Desenvolvimento, órgão controlador da economia, diretamente subordinado à Presidência, designando para integrá-lo os ministros de Estado, os chefes dos gabinetes Civil e Militar e os presidentes do Banco do Brasil (BB) e do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE).
Em princípios de outubro de 1957, o ministro da Fazenda José Maria Alkmin compareceu à reunião da junta de governadores do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), conhecido como Banco Mundial, realizada em Washington.
No intuito de atender às exigências do FMI, Lucas Lopes elaborou o Plano de Estabilização Monetária (PEM), que estabelecia uma rigorosa política antiinflacionária. Embora considerasse relevante a adoção dessa política ante a delicada situação financeira do país, Juscelino mostrou-se intransigente em relação à liberação das verbas destinadas ao Programa de Metas.
No âmbito econômico, ao assumir a presidência Juscelino herdou a difícil situação dos governos Vargas e Café Filho. A superprodução do café, os déficits do Tesouro e perda do poder de compra das exportações formavam na época, segundo analisou o economista Carlos Lessa, um "quadro impressionante de desequilíbrios econômicos".
Embora a economia acusasse instabilidade e crescente inflação, o ministro da Fazenda, José Maria Alkmin, propôs-se basicamente a impedir que os desequilíbrios tomassem vulto a ponto de comprometer o êxito do programa desenvolvimentista de Kubitschek.
O Programa de Metas, destinado sobretudo a promover o desenvolvimento acelerando o processo de industrialização, teve vários de seus objetivos consideravelmente ultrapassados em relação aos previamente estipulados. Para a implementação desse programa foram criados grupos de trabalho subordinados ao Conselho de Desenvolvimento.
Além dos estímulos permitidos pela legislação que favorecia a entrada de capital estrangeiro, o governo dispunha de outra importante fonte para angariar recursos. Através do BNDE assegurava o acesso a créditos do exterior aos empresários, que assumiam a co-responsabilidade pela liquidação do débito. A grande entrada de capital estrangeiro foi, no entanto, a principal fonte de oposição à política econômica de Juscelino, notadamente por parte da esquerda. De um lado, o mecanismo de proteção às manufaturas de origem nacional obrigava as empresas norte-americanas a investir diretamente no Brasil, a fim de não perderem o mercado. Do outro, o governo concedia isenções e privilégios, permitindo que aquelas empresas importassem bens de produção, sem cobertura cambial, enquanto negava o mesmo direito às brasileiras.
Como a participação inicial do capital norte-americano para a execução do Plano de Metas era irrisória, o processo de aceleração industrial encontrou viabilidade na entrada de capitais europeus e japoneses. Entretanto, a entrada destes capitais, notadamente do alemão, fortaleceu no Brasil a área de resistência aos Estados Unidos, ao mesmo tempo que impeliu este país a incrementar os investimentos na indústria brasileira para manter e consolidar sua hegemonia.
O complexo Plano de Estabilização Monetária (Pem) envolvia sérias providências corretivas nos setores da moeda, do crédito, das finanças públicas e salários e do balanço de pagamentos. Diante da difícil situação financeira do país, ao ser discutido no Congresso, o Pem sofreu inúmeros cortes e modificações. A solução encontrada foi a sustentação do plano, com as emendas introduzidas e a simultânea concessão de um "abono de emergência" ao funcionalismo civil e militar da União.
Enquanto aguardava a decisão do Congresso, Lucas Lopes, com o objetivo de minorar os efeitos da crise financeira, tomou medidas corretivas, comprimindo as despesas, controlando com rigor a política de liberação de verbas, sustando a execução de obras consideradas adiáveis e alterando substancialmente o nível das taxas de câmbio.
Em represália ao pouco interesse demonstrado pelos EUA em empreender um programa de assistência ao Brasil e aos outros países da América Latina, em novembro de 1958, Juscelino manifestou-se publicamente pelo reatamento das relações comerciais com a União Soviética e outros países socialistas, sob aplausos de líderes sindicais que compareceram ao Catete.
Em 1959, quando o Pem entrou em execução, determinando uma vertiginosa elevação dos preços, ocorreu forte reação popular em oposição às medidas implementadas. Entretanto, como essa política de estabilização foi considerada insatisfatória pelo FMI, Lucas Lopes seguiu para os EUA, assumindo o compromisso, junto às autoridades daquele órgão, de ampliar as medidas corretivas do Pem.
Embora o FMI aceitasse a contraproposta do Brasil, os jornais ligados a esse organismo desencadearam uma campanha de descrédito contra a economia brasileira. Tendo Lucas Lopes adoecido repentinamente, Juscelino decidiu conduzir as negociações com o FMI. Assim, ao se iniciar o mês de junho de 1959, Juscelino teve que optar por uma atitude a ser assumida pelo governo: ou submeteria o país às condições exigidas pelo FMI ou romperia com aquela entidade. Decidido a dar prosseguimento ao programa desenvolvimentista, optou pela ruptura com o FMI.
A política econômica do governo Kubitschek teria fortes repercussões sobre o processo de sucessão presidencial. Nas eleições realizadas em 3 de outubro de 1960, o candidato apoiado pela UDN, Jânio Quadros, obteve esmagadora vitória, apesar da reeleição de João Goulart à vice-presidência da República. Em 31 de janeiro de 1961, Kubitschek transmitiu o poder a Jânio Quadros. Nas eleições extraordinárias realizadas em 4 de junho de 1961, Juscelino elegeu-se senador por Goiás na legenda do PSD.
Em 31 de março de 1964 eclodiu o movimento militar que depôs Goulart. No dia 7 de daquele mês, Juscelino, em encontro proposto por Castelo Branco, manteve com este conversações acerca do problema sucessório. Ante o declarado interesse de Castelo Branco em concorrer às eleições presidenciais, apoiou essa pretensão. No dia 9 de abril, o Comando Supremo da Revolução promulgou o Ato Institucional Nº 1 (AI-1), que determinava a eleição dois dias depois, pelo Congresso Nacional, do presidente da República, que exerceria o poder até 31 de janeiro de 1966, quando seria empossado seu sucessor a ser eleito pelo sufrágio popular. O AI-1 também outorgava ao chefe do Executivo o poder de cassar mandatos parlamentares e suspender direitos políticos.
Em 3 de junho de 1964, Costa e Silva formulou o pedido de cassação de Juscelino. Enquanto o processo caminhava o PSD procurou sustá-lo. Em 8 de junho de 1964, porém, foi assinado o ato - divulgado dois dias depois - que cassava o mandato de Juscelino e suspendia seus direitos por dez anos, provocando a imediata decisão do PSD de retirar-se do bloco parlamentar de apoio ao presidente Castelo Branco.
Decidindo exilar-se, Juscelino seguiu para a Europa no dia 14 daquele mês. Em 4 de outubro de 1965, após longa permanência na Europa, parte na França e parte em Portugal, voltou ao Brasil, contrariando a direção do PSD e sendo recebido em meio a grande manifestação por parte de seus correligionários.
Em face da sucessão de inquéritos policiais-militares perante os quais foi convocado para prestar depoimento, Juscelino decidiu ausentar-se de novo do país. Só retornaria ao Brasil em junho de 1966, quando foi autorizado pelo governo a permanecer no país por 72 horas a fim de assistir aos funerais de sua irmã.
Em setembro de 1966 a imprensa divulgou a constituição de uma frente política - a Frente Ampla - que reunia Lacerda, seu principal articulador, Kubitschek e Goulart.
Em março de 1967, já estando Costa e Silva na presidência, foi por várias vezes noticiado o lançamento de um manifesto da Frente Ampla. Em maio Juscelino retornou definitivamente ao Brasil, fixando residência no Rio de Janeiro. Embora tivesse obtido do governo a garantia de plena liberdade de movimento, foi advertido de que estaria sujeito a prestar depoimentos nos inquéritos em que estivesse envolvido. Ainda em 1967, Juscelino assumiu o cargo de diretor-presidente do conselho administrativo do Banco Denasa de Investimento, de cuja organização participara.
O agravamento da situação política levou o governo a um enrijecimento de suas posições, extingüindo a Frente Ampla no dia 5 de abril de 1968. Com a extinção do movimento, Juscelino abandonou definitivamente o cenário político, dedicando-se à área empresarial.
Em junho de 1974 foi eleito membro da Academia Mineira de Letras. Em 18 de junho de 1976 recebeu o troféu "Juca Pato" conferido pela União Brasileira de Escritores, em São Paulo, por ter sido eleito o intelectual do ano de 1975. Por essa época, abandonou suas funções junto ao Banco Denasa, passando a dedicar-se à administração da fazenda que possuía em Luziânia (GO). Em 22 de agosto de 1976 faleceu, vítima de desastre sofrido na via Dutra, nas proximidades de Resende (RJ).
Em abril de 1980, teve início em Brasília a construção de um monumento em homenagem a Juscelino - O Memorial JK - projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer. Em 12 de setembro, dia em que JK completaria 79 anos, dona Sara e o presidente João Batista Figueiredo inauguraram o Memorial JK, no qual seria instalado um museu e uma biblioteca.
[Fonte: Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro pós 1930. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2001]

Leonardo Boff

Consolidar a ruptura histórica operada pelo PT
Leonardo Boff *
Para mim o significado maior desta eleição é consolidar a ruptura que Lula e o PT instauraram na história política brasileira. Derrotaram as elites econômico-financeiras e seu braço ideológico, a grande imprensa comercial. Notoriamente, elas sempre mantiveram o povo à margem da cidadania, feito, na dura linguagem de nosso maior historiador mulato, Capistrano de Abreu, "capado e recapado, sangrado e ressangrado". Elas estiveram montadas no poder por quase 500 anos. Organizaram o Estado de tal forma que seus privilégios ficassem sempre salvaguradados. Por isso, segundo dados do Banco Mundial, são aquelas que, proporcionalmente, mais acumulam no mundo e se contam, política e socialmente, entre as mais atrasadas e insensíveis. São vinte mil famílias que, mais ou menos, controlam 46% de toda a riqueza nacional, sendo que 1% delas possui 44% de todas as terras. Não admira que estejamos entre os países mais desiguais do mundo, o que equivale dizer, um dos mais injustos e perversos do planeta.

Até a vitória de um filho da pobreza, Lula, a casa grande e a senzala constituíam os gonzos que sustentavam o mundo social das elites. A casa grande não permitia que a senzala descobrisse que a riqueza das elites fora construída com seu trabalho superexplorado, com seu sangue e suas vidas, feitas carvão no processo produtivo. Com alianças espertas, embaralhavam diferentemente as cartas para manter sempre o mesmo jogo e, gozadores, repetiam: "façamos nós a revolução antes que o povo a faça". E a revolução consistia em mudar um pouco para ficar tudo como antes. Destarte, abortavam a emergência de outro sujeito histórico de poder, capaz de ocupar a cena e inaugurar um tempo moderno e menos excludente. Entretanto, contra sua vontade, irromperam redes de movimentos sociais de resistência e de autonomia. Esse poder social se canalizou em poder político até conquistar o poder de Estado.


Escândalo dos escândalos para as mentes súcubas e alinhadas aos poderes mundiais: um operário, sobrevivente da grande tribulação, representante da cultura popular, um não educado academicamente na escola dos faraós, chegar ao poder central e devolver ao povo o sentimento de dignidade, de força histórica e de ser sujeito de uma democracia republicana, onde "a coisa pública", o social, a vida lascada do povo ganhasse centralidade. Na linha de Gandhi, Lula anunciou: "não vim para administrar, vim para cuidar; empresa eu administro, um povo vivo e sofrido eu cuido". Linguagem inaudita e instauradora de um novo tempo na política brasileira. O "Fome Zero", depois o "Bolsa Família", o "Crédito Consignado", o "Luz para Todos", o "Minha Casa, minha Vida, o "Agricultura familiar, o "Prouni", as "Escolas Profissionais", entre outras iniciativas sociais permitiram que a sociedade dos lascados conhecesse o que nunca as elites econômico-financeiras lhes permitiram: um salto de qualidade. Milhões passaram da miséria sofrida à pobreza digna e laboriosa e da pobreza para a classe média. Toda sociedade se mobilizou para melhor.


Mas essa derrota infligida às elites excludentes e anti-povo, deve ser consolidada nesta eleição por uma vitória convincente para que se configure um "não retorno definitivo" e elas percam a vergonha de se sentirem povo brasileiro assim como é e não como gostariam que fosse. Terminou o longo amanhecer.


Houve três olhares sobre o Brasil.

Primeiro, foi visto a partir da praia: os índios assistindo a invasão de suas terras.
Segundo, foi visto a partir das caravelas: os portugueses "descobrindo/encobrindo" o Brasil.
O terceiro, o Brasil ousou ver-se a si mesmo e aí começou a invenção de uma república mestiça étnica e culturalmente que hoje somos.

O Brasil enfrentou ainda quatro duras invasões:

a colonização que dizimou os indígenas e introduziu a escravidão;
a vinda dos povos novos, os emigrantes europeus que substituíram índios e escravos;
a industrialização conservadora de substituição dos anos 30 do século passado mas que criou um vigoroso mercado interno e,
por fim, a globalização econômico-financeira, inserindo-nos como sócios menores.

Face a esta história tortuosa, o Brasil se mostrou resiliente, quer dizer, enfrentou estas visões e intromissões, conseguindo dar a volta por cima e aprender de suas desgraças. Agora está colhendo os frutos.


Urge derrotar aquelas forças reacionárias que se escondem atrás do candidato da oposição. Não julgo a pessoa, coisa de Deus, mas o que representa como ator social.

Celso Furtado, nosso melhor pensador em economia, morreu deixando uma advertência, título de seu livro A construção interrompida (1993): "Trata-se de saber se temos um futuro como nação que conta no devir humano. Ou se prevalecerão as forças que se empenham em interromper o nosso processo histórico de formação de um Estado-Nação" (p.35). Estas não podem prevalecer. Temos condições de completar a construção do Brasil, derrotando-as com Lula e as forças que realizarão o sonho de Celso Furtado e o nosso.

[Autor de Depois de 500 anos: que Brasil queremos, Vozes (2000)].

* Teólogo, filósofo e escritor


 HISTÓRIA DE DUQUE DE CAXIAS - RJ
Igreja do Pilar

Em 1566 iniciou-se o povoamento da área que hoje constitui o município, em terras doadas a Martin Afonso de Souza, após a expulsão dos franceses do Rio de Janeiro. Os primeiros colonos fixaram-se nos vales dos rios Sarapuí, Meriti, Iguaçú e Estrela, e nas terras situadas entre o mar e a orla das serras. Em todo o período colonial desenvolveram-se fazendas, engenhos e cultivos nas terras muito férteis geradas pelo humus das florestas.
Entre os anos de 1779 e 1789 foram formadas as "Freguesias"da Capitania do Rio de Janeiro, que eram organizações políticas que floresceram desde o período colonial até o início da república e que indicavam que um povoado estava pronto a constituir-se município.
Em 1886 foi inaugurado o trecho ferroviário da "The Rio de Janeiro Northern Railway", ligando a cidade do Rio de Janeiro à estaçao de Meriti, estação esta que originou o povoado que seria o embrião do atual município de Duque de Caxias.
Nesta época o povoado de Meriti era apenas um centro de escoamento de umas poucas propriedades rurais semi-abandonadas, cujos colonos, lutando contra a malária, se dedicavam ao fabrico de carvão e à extração de lenha. Com a expansão da epidemia de malária e a assinatura da Lei Aurea, em 1888, houve um abandono da mão de obra negra das fazendas e engenhos de cana.
Além disto, a devastação da mata causou empobrecimento e erosão dos solos, obstrução dos rios , cujo extravasamento causou a formação dos pântanos, e consequentemente intensificou a proliferação do mosquito transmissor da malária, e por fim o abandono total das terras.
O combate às doenças endêmicas, as obras de saneamento, com desobstrução de rios e abertura de canais, contribuíram para reversão deste quadro e a abertura da Rodovia Rio-Petrópolis , em 1928 estimulou ainda mais o crescimento do povoado de Meriti.
Em 1931 foi criado o Distrito de Caxias, com sede no povoado gerado pela antiga estação Meriti, e formado com uma parcela do território desmembrado do Distrito de Meriti. Em 1943, por intermédio do Decreto-Lei Nº 1956, o Distrito de Caxias foi elevado a categoria de Município, passando sua sede a chamar-se Cidade de Duque de Caxias.

Localização e características geográficas
O município de Duque de Caxias está localizado na Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro, e juntamente com os municípios de Nova Iguaçu, São João de Meriti, Belford Roxo, Queimados e Nilópolis conformam uma região comumente chamada de Baixada Fluminense, que se caracteriza pela grande concentração de pobreza e de carencia de infra-estrutura urbana.
A área total do município é de 442 Km2, correspondendo a 6,8% da área da Região Metropolitana e a 35% da área da Baixada Fluminense. Tem como limites, ao norte os municípios de Miguel Pereira e Petrópolis, ao sul o município do Rio de Janeiro, a leste o município de Magé e a Baía de Guanabara, e a oeste os municípios de São João de Merití e Nova Iguaçu.
Os pontos extremos do município são definidos, segundo Lazaroni em "O Município de Duque de Caxias", ao norte pelo alto da Pedra Riscada, na Serra da Estrela, ao sul pela foz do rio Meriti, a leste pela confluência do rio Imbariê com o rio Estrela e a oeste pela confluência do ribeirão das Piabas com o rio Otum.
Situa-se a 19 metros do nível do mar, sendo que cerca de 65% de seu território é constituído por planície, que se estende desde o rio Meriti até o rio Estrela, a partir da orla da baía de Guanabara até a base da serra do Mar. Aí estão contidas grandes áreas alagadiças resultantes do assoreamento dos cursos d’água que cortam estas terras baixas, como os rios Sarapuí, Iguaçu e Meriti, além de outros de importância mais restrita, como os rios Capivarí, Tinguá, Pilar, Saracuruna e Estrela. O clima é úmido, típico da baixada litorânea tropical quente, sendo mais ameno nas áreas mais montanhosas. (Secretaria Municipal de Planejamento de Duque de Caxias, 1992).
Duque de Caxias apresenta uma série de problemas ambientais que, segundo a FEEMA, 1990/1991, foram classificados em:
. críticos: eficiência de sistemas de esgoto sanitário, degradação de áreas de preservação, deficiência de cobertura arbórea, precárias condições de vida, vetores, favelização e subhabitação, refúgios de flora e fauna ameaçados, risco de acidentes, poluição de águas, inundações e enchentes, resíduos sólidos, poluição do ar, assoreamento de corpos de água, poluição de praias, aterros de corpos d’água, vazamento e lançamento de óleo;
. semicríticos : erosão do solo, ocupação de encostas e poluição sonora;
. em estado de alerta: agrotóxicos, loteamento em áreas frágeis, deslizamentos e mineração.

Organização político-administrativa
Segundo a Secretaria Municipal de Planejamento, o município está dividido em quatro Distritos, quais sejam:
. 1º Distrito : Duque de Caxias
. 2º Distrito : Campos Elíseos ( Distrito Sede)
. 3º Distrito : Imbariê
. 4º Distrito : Xerém
O Primeiro Distrito, Duque de Caxias, com características de área predominante urbana, ocupa 41 Km2, está situado ao sul, estando constituído pelos seguintes bairros: Centro, Gramacho, Olavo Bilac, Bar dos Cavaleiros, Parque Duque, Jardim 25 de Agosto, Vila São Luís, Dr. Laureano, Periquitos e Parque Sarapuí.
O Segundo Distrito, Campos Elísios, ocupando uma área de 98 Km2 na região centro-oeste do município, também apresenta características de área predominantemente urbana, compreendendo os seguintes bairros: Campos Elíseos (sede), Jardim Primavera, Saracuruna, parte de Santa Cruz da Serra, Parque Fluminense, Pilar, Vila São José, São Bento, parte da Cidade dos Meninos, Figueira, Cangulo, parte da Chácara Rio-Petrópolis e Arcompo, e parte do Parque Eldorado.
O Terceiro Distrito, Imbariê, situado à nordeste do município, com cerca de 64 Km2, e ocupado por grandes áreas rurais, abrange os seguintes bairros: Imbariê (sede), Parada Angélica, parte de Sta. Cruz da Serra, parte de Sto. Antônio , parte do Meio da Serra, Parada Morabí, Jardim Anhangá, Cidade Parque Paulista, Bairro Branco, Santa Lúcia e Taquara.
O Quarto e último Distrito, Xerém, a noroeste, possui caracteristícas predominantemente rurais. É o maior dos distritos, ocupando uma área de cerca de 239 Km2 e compreendendo os seguintes bairros: Xerém (sede), Mantiquira, Capivarí, Amapá, parte da Cidade dos Meninos, parte da Chácara Rio-Petrópolis, parte do Parque Eldorado, Lamarão, parte de Sto. Antônio, e parte do Meio da Serra.
Segundo ainda a Secretaria Municipal de Planejamento, a ocupação urbana compromete cerca de 37% (163 Km2) da área do território municipal, sendo mais adensada no 1º e 2º distritos, e mais dispersa no 4º Distrito.
O 3º e 4º distritos abrigam ainda extensas área de preservação ambiental, quais sejam: Reserva Municipal, ao norte, no 3º e 4º distritos; área de Preservação Ambiental de Petrópolis, ao norte do 3º Distrito e a nordeste do 4º Distrito; Reserva Biológica do Tinguá, ao norte do 4º Distrito; Floresta Protetora da União, ao norte do 4º Distrito, nas proximidades da Barragem de Saracuruna; e os manguezais, que outrora formavam extensas área nos contatos dos rios com a Baía de Guanabara, e que hoje estão restritos às áreas próximas da foz do rio Iguaçu.
Características econômicas e sócio-demográficas
Duque de Caxias é o segundo pólo industrial da Região Metropolitana e do Estado do Rio de Janeiro, respondendo por 27,1% do valor da produção (VP), sediando aproximadamente 5,2% das empresas do estado e cerca de 6,7% das empresas da Região Metropolitana.
A produção industrial do município está fortemente concentrada na indústria química, responsável por 90,7% do VP em 1985. Os demais gêneros respondiam pelos seguintes percentuais: têxtil : 1,5%; vestuário : 0,9%; alimentares : 1,1%; diversos : 1,7%; outros: 4,1%.
Abriga a Refinaria de Caxias (REDUC), maior unidade industrial da área do Grande Rio e a Fábrica de Borracha Sintética (FABOR), indústrias que foram de grande importância para o desenvolvimento da região. Em torno da REDUC (produção de combustíveis, nafta, GPL, etc) surgiram uma série de indústrias químicas, algumas de grande porte e associadas à refinaria como a PETROFLEX, NITRIFLEX e outras independentes, além de um conjunto de médias e pequenas empresas produtoras de resinas, tintas, velas, parafinas e outros produtos químicos.
Alguns segmentos industriais vêm ganhando importância ultimamente , como é o caso das confecções, indústria moveleira e a de alimentos, de tal forma que atualmente pode-se considerar que, com exceção do complexo da Petrobrás, o parque industrial de Duque de Caxias é formado por médias e pequenas empresas.
É considerado como " Zona de Produção Secundária" pela Petrobrás em função de procedimentos de escoamento de produção através de ductos situados no 2º Distrito, Campos Elíseos, fazendo portanto parte do conjunto de municípios que têm direito a indenização em função da extração de óleo e gás natural na plataforma continental.


 
BRASIL JÁ É A 8ª ECONOMIA MUNDIAL

Crise espanhola firmou Brasil na posição

Com base nos números do primeiro semestre, o PIB brasileiro seria de 1,8 trilhão de dólares, ante 1,5 trilhão de dólares da Espanha
A crise espanhola permitiu que o Brasil se firmasse na oitava posição entre as maiores economias do mundo. Com base em números oficiais, o jornal econômico espanhol Expansion revelou que o ranking das maiores economias foi bastante modificado com a crise global nos últimos dois anos.
A China ultrapassou o Japão e agora se tornou a segunda maior economia do mundo. Já o Brasil supera a Espanha e é a oitava potência, em termos de Produto Interno Bruto (PIB) nominal. Com base nos números do primeiro semestre, o PIB brasileiro seria de 1,8 trilhão de dólares, ante 1,5 trilhão de dólares da Espanha. Segundo o jornal, a Espanha chegou a ficar na sétima posição em 2007, quando ainda vivia um boom econômico. Mas, com 20% de desemprego, um déficit colossal e uma economia estagnada, perdeu posições.
Já dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), organizados por Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, indicam que a ultrapassagem da Espanha pelo Brasil teria acontecido ainda em 2009. Mas a persistência da crise nos países ricos e a rápida recuperação dos emergentes, como o Brasil, fizeram com que a diferença entre os dois países disparasse em 2010.
Em 2009, segundo os dados do FMI, o Brasil, com PIB de 1,57 trilhão de dólares, estava na oitava posição do ranking, mas colado na Espanha, que era a nona colocada, com 1,46 trilhão de dólares. Já a projeção do FMI para 2010 joga o PIB brasileiro para 1,91 trilhão de dólares, bem acima do 1,56 trilhão de dólares previsto para a Espanha.
 
Fonte: Revista "Veja", em 21/08/2010

As 10 maiores economias (PIB em bilhões de dólares):
1. EUA…..14,217
2. China…..5,220
3. Japão…..5,118
4. Alemanha…..3,415
5. França…..2,666
6. Itália…..2,089
7. Reino Unido…..2,066
8. Brasil…..1,797
9. Espanha…..1,464
10. Canadá…..1,347

fonte: Expansión


O MISTÉRIO DE UMA CIVILIZAÇÃO

Esta civilização, que hipnotiza os trabalhos arqueológicos até hoje, surgiu quando os britânicos, que dominaram a Índia entre 1757 e 1947, começaram a construir ferrovias em seus, então, domínios. Quando inauguraram o primeiro trem, os construtores viram que seria difícil obter material para a sustentação dos trilhos. Quando escavaram trilhos para estabelecer as linhas entre as cidades de Karachi e Lahore, os trabalhadores encontraram tijolos de argila cozidos.
Os engenheiros encarregados da obra, os escoceses John e William Brunton, examinaram os tijolos encontrados e viram que se tratava de um substituto econômico para o cascalho. Assim, deram ordem para que seus subordinados continuassem a desenterrar. Aos poucos, outros objetos, incluindo estatuetas e selos com inscrições desconhecidas, foram sendo descobertos.
Porém, ninguém tomou providências para que o local fosse adequadamente preservado, e as construções continuaram. Dessa forma, os tijolos da então desconhecida cidade de Harappa acabaram por ser a base para a construção de pelo menos 160 quilômetros da ferrovia. Apenas 65 anos depois é que os arqueólogos chegaram à conclusão de que ali havia uma civilização que era da mesma época dos mesopotâmicos. Esta foi conhecida como Civilização do Vale do Indo ou Harappeana.
John Marshall era o diretor das pesquisas arqueo lógicas na Índia durante a década de 1920. Foi em 1924 que ele anunciou a descoberta de uma nova civilização, seus trabalhos haviam começado apenas dois anos antes no que era então o noroeste da Índia e hoje é conhecido como Paquistão. Selos estranhos foram encontrados, gravados numa escrita desconhecida. Entretanto, Marshall e sua equipe nem poderiam imaginar que eram apenas sinais de cidades inteiras.
Um pouco mais de trabalho e logo apareceram os primeiros traços do que hoje se sabe ser as ruínas de Mohenjo-daro e Harappa, que indicavam a existência de uma grande civilização da Idade do Bronze, datada de um período estimado entre 2600 e 1900 a.C. Hoje, essas ruínas são conhecidas como “Civilizações do Vale do Indo” e cobrem uma área enorme. Havia pelo menos cinco cidades grandes, bem como vilarejos e pequenos assentamentos agrícolas.



Shutterstock
Os Edifícios
Mohenjo-daro, uma das cidades grandes, é a mais explorada e estudada até hoje. Os trabalhos recentes nessa cidade sugerem que no geral cobria uma área extensa (aproximadamente 200.670 metros quadrados). Destes, apenas 10% foram escavados. A área central, um enorme monte na cidadela, foi construído numa plataforma e paira cerca de 9 metros acima do nível do chão. É cercado por um muro, possivelmente para proteger os habitantes de inundações.
Muitas das construções na cidade, como em outros locais de escavação no Vale do Indo, foram construídas com tijolos cozidos. Há outros fatores comuns, incluindo o fato de que medidas padrões parecem ter sido usadas por toda a região. Também há por lá algumas construções proeminentes, incluindo uma conhecida como O Grande Banho, que parece ter sido importante parte de um ritual de purificação. O Banho mede 9,75 por 7,01 metros e tem uma profundidade de 2,44 metros. Os tijolos usados habitualmente foram mergulhados em betume para tornar o local à prova de água; era cercado por uma colunata e um complexo de pequenas salas. Havia próximo dali um celeiro de cerca de 50 metros.
A parte baixa da cidade, que poderia conter 100 mil habitantes, também estava acima do nível das inundações, embora fosse fortificada. Era constituída em forma de grade e as causas eram construídas ao redor de seus próprios quintais, que eram alguns metros mais altos. O que mais chama a atenção nessas construções é o fato da maioria delas possuir banheiros e um poço próprio e que eram conectadas ao sistema de esgoto da cidade, composto por uma série de redes de drenagem.
Mesmo antes que Marshall fizesse o anúncio oficial da descoberta das cidades do Indo, os selos com a misteriosa escrita já haviam sido descobertos na área


Uniformidade
O nível de uniformidade nas escavações é considerado perfeito, especialmente numa área tão ampla. Muitos assumiram que tal situação seria o resultado do domínio de uma elite, provavelmente rígida, mas não há provas arqueológicas que confirmem isto.
Não há residências de elite no local nem sinais de nenhum tipo de concentração de riqueza. Também não há sinais de investimentos em grandes funerais. Apenas há alguns vestígios de uma espécie de autoridade sacerdotal, embora hoje os pesqui sadores acreditem que as civilizações que lá floresceram eram do tipo igualitário, especialmente quando em contraste com outras civilizações contemporâneas como a cidade suméria de Ur, com seus elaborados enterros reais e sacrifícios.
Mesmo antes que Marshall fizesse o anúncio oficial da descoberta das cidades do Indo, os selos com a misteriosa escrita já haviam sido descobertos na área. De fato, um deles já era objeto de estudo em 1873. Hoje se sabe de cerca de três mil selos que vêm não apenas do Vale do Indo, mas de regiões vizinhas que pertencem a outras civilizações. Há inscrições sobre todo o tipo de coisa, que prova serem aqueles grupos bem letrados. A escrita possui cerca de 220 sinais simples e 200 compostos, que até hoje permanecem desconhecidos.
Até hoje não foi descoberta nenhuma inscrição bilíngue para que se pudesse comparar a língua com alguma conhecida. Até que isso aconteça, os grupos do Vale do Indo continuarão a ser classificados como pré-históricos. Afinal, não se sabe o motivo pelo qual desapareceram. Secas, enxurradas e invasões dos povos arianos (tribos bárbaras vindas da Ásia Central pelas montanhas do Hindu Kush), muitos foram apontados como motivos sem haver uma prova concreta e deverá permanecer assim até que sua antiga linguagem possa ser lida e dar alguma pista.



HOUSE HISTORIADOR
Um personagem de TV de sucesso que pode ser visto historicamente
Rodrigo Elias
Gregory House é cínico, ranzinza, pessimista, anti-social, machista, negligente, insubordinado, mentiroso, mesquinho, despótico, além de diversos outros predicados pouco lisonjeiros. Gregory House também é médico, chefe da mais conceituada equipe de diagnósticos dos Estados Unidos, capaz de descobrir doenças raríssimas ou que estejam ocultas sob sintomas enganosos.



Entretanto, Gregory House só existe na imaginação das pessoas: trata- se de um personagem de ficção. O seriado House, M.D. (no Brasil, Dr. House), criado pelo ex-advogado e escritor canadense David Shore, estreou na TV norte-americana em 2004. Desde o início se mostrou um grande sucesso de audiência em vários países, inclusive no Brasil, onde é exibido na televisão aberta e em um canal fechado. Mas, qual a relação entre um seriado médico norte-americano e a História?

A relação entre os ofícios do médico e do historiador já foi objeto de análise de alguns teóricos, como o famoso texto “Sinais: raízes de um paradigma indiciário”, do italiano Carlo Ginzburg, originalmente publicado em 1986. Neste intrincado e erudito estudo, o historiador italiano identifica o surgimento, no final do século XIX, de um modelo na construção de conhecimento entre as ciências humanas, das quais fazem parte, entre outras, a Antropologia e a História. Este modelo, ou paradigma, que chamou de “indiciário”, reunia características que podiam ser observadas em personagens aparentemente tão distantes quanto o fundador da psicologia moderna, Sigmund Freud, o crítico de arte Giovanni Morelli e Sherlock Holmes, personagem do gênero policial criado pelo escritor Arthur Conan Doyle.

Morelli escreveu na década de 1870 sobre a autoria de alguns quadros que estavam expostos em museus da Europa. Seu método consistia basicamente em identificar detalhes geralmente negligenciados pelos especialistas em arte, aspectos secundários aos quais os próprios pintores não davam muita importância – nas figuras humanas, a forma como eram desenhadas as unhas ou os lóbulos das orelhas, por exemplo. Assim, ao contrário da luminosidade de um quadro ou da disposição dos elementos na tela, os pormenores, digamos, menos nobres ofereceriam ao observador atento a verdadeira identidade do seu autor. Assim, os historiadores da arte passaram a utilizar o método de Morelli (mesmo sem fazer referência explicitamente) para a atribuição de autoria.

No final daquele século, Freud tomou interesse pela arte, motivo pelo qual deparou-se com textos de Morelli. Chegou a fazer referência ao crítico italiano, atribuindo ao seu método de identificação de autoria a importância que o próprio “pai da psicanálise” daria aos “detritos” na sua prática psicanalítica. Escreve Freud sobre Morelli, em ensaio de 1914: “creio que o seu método está estreitamente aparentado à técnica da psicanálise médica”.

O escocês Arthur Conan Doyle, por sua vez, deu ao seu principal personagem, o detetive Sherlock Holmes, uma capacidade extraordinária de descobrir autoria de crimes a partir de pequenos detalhes – pegadas, restos de cigarros, características anatômicas que geralmente passam despercebidas. A primeira aparição de Holmes foi no romance Um estudo em vermelho, de 1887.

Temos, portanto, segundo Ginzburg, uma clara correspondência entre o método atributivo nos signos pictóricos de Morelli, os sintomas presentes nos lapsos comportamentais na psicanálise de Freud e os indícios nos casos investigados por Sherlock Holmes. Este “paradigma indiciário”, identificado pelo historiador italiano, estaria, de algum modo, presente de maneira difusa na história humana desde a sua infância – na medida em que os primeiros grupos de caçadores forçosamente interpretavam todos os tipos de rastros para poder capturar suas presas. Entretanto, no século XIX este princípio estava sistematizado e colocado a serviço do entendimento ou do deleite burguês ocidental – seja através do conhecimento prático, das discussões artísticas ou das construções ficcionais.

Ainda naquele século, portanto, o paradigma era incorporado de maneira eficaz a algumas áreas do conhecimento acadêmico, em especial a História. Em 1897 era publicado, na França, o livro Introdução aos Estudos Históricos, de Charles-Victor Langlois e Charles Seignobos. Nesta obra, uma das bases da atividade historiográfica acadêmica e profissional no século XX, foram estabelecidos os parâmetros do trabalho com os documentos – as fontes a partir das quais os historiadores constroem suas interpretações sobre os eventos passados. Ali estão sistematizados os métodos investigativos, os tipos de documentos existentes e a abordagem adequada a cada um deles e, o mais importante, o reconhecimento de que a História não é um conhecimento construído a partir da observação direta, mas da atenção às informações fragmentárias que sobreviveram ao tempo – isto é, indícios. Apesar de todas as críticas dirigidas pela historiografia dos Annales e de outras correntes ao manual de Langlois e Seignobos ao longo do século XX, este último ponto ainda não perdeu totalmente a validade.

Na série de TV, o personagem principal pouco tem contato direto com os seus pacientes. Misantropo notório, evita ao máximo a aproximação com os doentes, deixando este trabalho para os seus assistentes – ou seja, assim como um historiador, que em geral não tem acesso direto ao objeto de estudo, mas sim a testemunhos (de primeira ou segunda mão), House depende de intermediários.

Além disso, ele não acredita nas informações passadas pelos pacientes que, mesmo sabendo da gravidade da situação médica, podem, por algum motivo, sonegar dados cruciais para a construção do diagnóstico – geralmente por uma questão de fundo moral. Simplificando – e recorrendo a um dos bordões famosos do dr. Gregory House –, “todo mundo mente”. Aliás, nas falas do personagem transparece muito claramente a noção de que o discurso não possui uma correspondência direta com a realidade concreta do mundo, o que seria um fato da vida social: “mentiras são como crianças: são inconvenientes, mas o futuro depende delas”. Assim, o médico orienta os seus subordinados a invadir a casa dos pacientes ou investigar suas vidas de algum modo em busca de indícios de comportamentos ocultos ou de substâncias e situações que podem esclarecer sobre as patologias. Ora, um dos preceitos básicos do trabalho investigativo do historiador, tal como estabelecido no século XIX, é crítica documental, que, em termos simples, consiste em averiguar a autenticidade do relato (a “crítica externa”) e a sua fidedignidade (a “crítica interna”), sobretudo através da comparação com fontes paralelas – a base, portanto, para o trabalho com as fontes é a desconfiança nas mesmas.

O dr. Gregory House é interpretado pelo ator inglês Hugh Laurie, formado em Antropologia e Arqueologia pela tradicional Universidade de Cambridge. Giovanni Morelli, Sigmund Freud e Arthur Conan Doyle eram formados em Medicina – assim como o inseparável amigo de Sherlock Holmes, o dr. Watson. É possível que tudo isto não passe de uma grande coincidência. Mas, para aqueles que não acreditam muito em coincidências, pode ser um notável conjunto de indícios.

Saiba mais:
BLOCH, Marc. Apologia da História ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
LANGLOIS, Charles-Victor e SEIGNOBOS, Charles. Introduction to the Study of History. New York: Henry Holt and Company, 1904. (http://www.gutenberg.org/files/
29637/29637-h/29637-h.htm)
WHITE, Hayden. Meta-História: a imaginação histórica do século XIX. São Paulo: Edusp, 1992

FONTE:Revista de História da Biblioteca Nacional
Related Posts with Thumbnails